Uma reclamação constante que recebo,
geralmente de muitos pais, é em relação às mordidas que seus filhos levam ou às
atitudes que a escola costuma tomar referente a tais situações. Frequentemente
sou arguida quanto às causas desse tipo de comportamento, quanto às atitudes
que devem ser tomadas e até quanto aos procedimentos adotados pelos adultos da
escola.
As mordidas nessa etapa de vida são
extremamente esperadas e absolutamente normais. Claro que não é uma situação
agradável ver uma criança mordida. Isso incomoda e aborrece adultos de todas as
esferas: educadores, pais, estagiários, assistentes, babás, além da própria
criança.
Existem vários motivos para que uma criança,
na primeira infância, morda.
Desde o aparecimento dos primeiros dentes até
os 2 anos, aproximadamente, as crianças costumam morder brinquedos, pessoas de
seu convívio e objetos de seu dia-a-dia. Fazem isso em busca de novas sensações
e movimentos, tomando assim, aos poucos, consciência de seu próprio corpo – de
seu “eu corporal” e de seus limites.
Tal característica também é conhecida como
“fase oral”. Fase pela qual a criança começa a interagir com o mundo, através
da sua boca. E é justamente através da boca que a criança faz importantes
descobertas e começa a separar o que a constitui daquilo que constitui o outro.
Provoca reações ao mesmo tempo em que revela diferentes e inéditas sensações.
Outra razão para que as crianças mordam é a
falta de domínio verbal. Por não saberem se expressar, muitas vezes mordem por
conta da necessidade de se comunicarem. Assim conseguem, através das mordidas,
expressar seu descontentamento, suas frustrações, seus desejos e necessidades.
Mordem, então, por serem incapazes de se comunicarem com clareza.
Em contrapartida,
sentimentos de carinho e afeto também podem suscitar mordidas, justamente por
serem emoções que ainda não podem ser nomeadas pela criança. Afinal, quantas
vezes nós, adultos, expressamos amor por alguma criança, usando expressões
errôneas, como: “Que
lindo, dá até vontade de morder!” ou “Posso morder essa barriguinha?”
. Não podemos esquecer que o adulto é, de fato, o primeiro modelo a ser seguido
pela criança. Recordo-me de uma situação que retrata essa realidade.
Não me esqueço que,
tendo eu certa vez uma sala de crianças de 2 anos incompletos, vivi uma
situação bem interessante. Um de meus alunos, lá pelo meio do semestre, começou
a morder, sem nunca haver mordido antes. A criança se mostrava agressiva,
testando os seus e os meus limites. Tratando-se de um menino que se comunicava
muitíssimo bem, dono de um vocabulário maravilhoso para a sua idade, tentei de
diversas formas fazê-lo parar com tais comportamentos. Nada consegui. Foi aí
que resolvi chamar os pais para uma reunião. Assim que a mãe chegou, falei
sobre o que andava acontecendo dentro de nossa sala e ela, bem acanhada, cortou
meu discurso ao meio, desabafando: “-
Ah Elisa... Já sei o que acontece! Eu tenho o hábito de morder meu filho todos
os dias, logo depois do banho. Dou-lhe pequenas mordiscadas, pois ele é tão
fofinho! Sabe... tenho a mania de ir mordendo... Meu marido quase se separou de
mim antes do bebê nascer, tal a minha verdadeira fixação por mordidas!”.
A partir daí, ficou bem mais fácil encontrarmos a saída para o comportamento de
meu aluno!
É importante que todos saibam como agir
diante das situações nas quais uma criança é mordida por outra. Situações tão
comuns nas salas de Educação Infantil.
Não raro, os pais da criança mordida, depois
da terceira ou quarta reincidência, chateados e muitas vezes bem descontentes
em virtude das marcas de mordida em sua criança, me interpelam questionando a
respeito das atitudes que irei tomar com a criança e a família dela.
Tenho aqui que dar uma parada obrigatória. Há
algumas considerações que não posso deixar de explicitar neste texto.
Nenhuma criança, e digo nenhuma criança
realmente, merece levar o rótulo de “mordedora”, por mais que a vítima seja o
seu gostoso bebê. Isso fica mais fácil de aceitar como verdade, desde que todos
os adultos possam se colocar no lugar dessa criança. Ou melhor, e mais eficaz
ainda, imaginar que essa criança “mordedora” (que horrível!!!) poderia ser seu
próprio filho ou filha.
Senhores pais e responsáveis, pedimos que ao
se encontrarem diante desse fato possam contar com toda a estrutura e preparo
dos funcionários do Colégio Dom Bosco. Juntos, encontraremos novas estratégias
e soluções para cada fato ocorrido aqui. Sabemos o que devemos fazer, como agir
e que providências tomar. O Colégio Dom Bosco está preparado para agir nessas e
em outras ocasiões e está ciente do quanto fatos como esse estão inseridos no
desenvolvimento das crianças nessa faixa etária.
E por falar nisso, jamais se esqueçam também
de que “tirar satisfações” com os pais ou com a babá da criança que mordeu
várias vezes o seu filho em nada irá contribuir para que possamos solucionar
esses repetidos eventos.
Os pais dessas crianças invariavelmente estão
tão preocupados ou até mesmo tão arrasados quanto os pais das crianças que
foram mordidas. Além de não saberem como agir, ainda têm que circular entre
outros pais nos eventos infantis, com o rótulo de péssimo educador e ver o seu
filho ou filha sendo “isolado”, delicadamente, do convívio social das outras
crianças. É bem triste!
Feitas essas considerações, explico quais os
procedimentos que costumamos realizar, quando uma criança morde a outra:
·
Somos firmes com a criança que porventura tenha
mordido. Abaixamos para podermos olhar diretamente nos olhos dela e assim
conversarmos.
·
Mostramos o ferimento do colega e explicamos a
criança que ninguém gosta de sentir dor.
·
Oferecemos maneiras para que a criança que
mordeu possa ajudar a fazer o “curativo” na criança mordida.
·
Professores e orientadora procuram descobrir o
motivo que fez surgir tal comportamento e mostramos a criança outras formas de
expressão.
·
Tentamos solucionar esse desafio no contexto
escolar (pois se acontece aqui, na presença de outras crianças, a solução deve
vir daqui), porém, quando o fato se mostra repetitivo e algo mais se manifesta,
chamamos os pais, para juntos, em parceria, encontrarmos as causas desse
comportamento recorrente e eventuais estratégias para ajudar nossa criança.
Dessa forma, peço que se dispam de
preconceitos e que vivam em plenitude essa etapa que se inicia na vida de seus
filhos. Por aí vem uma infinidade de brincadeiras, de aprendizados e de
socializações que só se fazem possíveis quando vividos no ambiente escolar.
Nós, do Colégio Dom Bosco, nos preparamos dia
após dia para recebermos sua criança com todo o afeto e atenção. Da mesma
maneira também estamos aqui disponíveis para recebermos as dúvidas, os
questionamentos e as sugestões de todos os pais.
Contamos com sua parceria para fazermos dele
um ano ainda mais especial!
Simone Cristina de Rezende Watanabe
Coordenadora Pedagógica
Psicopedagoga